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A Relação do Mito Grego de Narciso e Eco com a Sociedade Atual

Se tem um personagem da mitologia que hoje mais do que nunca, faz muito eco em todas as mídias, redes sociais e conversas mundo afora, este é o Narciso.

Narciso, aquele jovem lindo, filho da ninfa Liríope e do deus-rio Cefiso, era destinado a morrer caso visse sua própria imagem. Seu destino tinha sido revelado pelo vidente Tirésias e sua mãe tentou o quanto pode distanciar Narciso do seu destino. O tempo passava e Narciso seguia encantando corações pela sua beleza. Um dia uma ninfa chamada Eco se apaixona por ele.

Eco é uma personagem fundamental na história de Narciso, da qual não ouvi nenhum psicanalista comentar (se alguém ouviu, por favor, comente!).


Eco é uma personagem fundamental na história de Narciso, da qual não ouvi nenhum psicanalista comentar (se alguém ouviu, por favor, comente!).

Narciso e Eco: O Mito

O mito de Narciso tem algumas variações. Por exemplo, entre outros detalhes, dependendo da história, ele morre afogado ou de inanição ao ver a própria imagem. Mas o fato muitas vezes esquecido, ou pouco valorizado, é a presença desse Eco que acompanha Narciso apaixonadamente pelo bosque e não consegue, apesar do seu amor, evitar a sua morte.

Diz o mito que Eco era uma ninfa fofoqueira que entreteve Hera, esposa de Zeus, em uma conversa para que o deus dos deuses tivesse suas aventuras extraconjugais com as ninfas. Ao descobrir a trama, Hera rogou uma praga em Eco e essa nunca mais pode falar, senão repetir os últimos sons de uma palavra.

Um dia, Narciso se perde no bosque e Eco vai ao seu encontro para tentar ajudá-lo, mas o rapaz prepotente quando percebe o amor de Eco, despreza a ninfa que acaba morrendo definhada de tristeza. Nêmesis a deusa da vingança, vendo que Narciso não se importou minimamente com o amor da ninfa, decidiu que era hora de punir o rapaz, e fazer com que a profecia de Tirésias se concluísse.

Foi então que Narciso encontrou o lago límpido e se abaixou para beber água vendo sua própria imagem. Narciso então sofreu a mesma dor de amor que acabou por matar Eco, tendo ele também morrido por causa de um amor impossível, no caso, por ele mesmo.

O Narciso de Freud

Sigmund Freud utiliza o mito de Narciso para descrever uma fase do desenvolvimento psíquico de cada um de nós. Todos somos, e devemos ser, narcisistas, porque o narcisismo nos permite existir. Para Freud, os bebês nascem sem um “eu” definido. Eles acreditam ser o mundo, e o mundo é eles. Conforme crescem, começam a perceber que não são o mundo, e o mundo não é eles, especialmente não são a mãe, com quem compartilharam um vínculo íntimo de vida desde a gestação. Esta é a fase do narcisismo primário. Posteriormente, surge o narcisismo secundário, quando a criança, após passar pela fase em que tudo é ela, autossuficientemente ela, começa a entender que precisa do outro e projeta sua libido em outras pessoas ou objetos, buscando gratificação e validação externa.

Aí entra o narcisismo que dizem hoje: o da “validação externa” a todo custo, o que é fundamental para uma criança; em um adulto pode ser problemático. Hoje não somos mais narcisistas que ontem, a questão é quantitativa e hoje, as redes sociais, a tecnologia digital, facilitou a exacerbação do nosso narcisismo.

O Narcisismo Clichê

O narcisismo clichê que a gente ouve por aí não tem a ver apenas com vaidade e com a vontade de ser o centro das atenções, o que faz parte da nossa constituição psíquica. Mas o narcisismo clichezão é a vaidade extrema, usada para manipular e subjugar o outro. Por isso, o narcisismo acaba sendo confundido com psicopatias e perversões. Não que psicopatas e perversos não possam ter suas doses de narcisismo, a questão é que todos nós temos também nossas doses de amar um espelho.

Mas não era essa a intenção do meu texto, e sim falar de Eco, a esquecida, mas tão presente ninfa, que faz ecoar esse mito como um dos maiores problemas da sociedade atual.

Onde é que Narciso se Esconde?

Narciso, além do clichê, é um cara sozinho com sérias dificuldades relacionais. Ele se basta sozinho, ele controla tudo, ele controla inclusive seus sentimentos, não se apaixona, não sofre, enfim, não se relaciona com o outro. Pode ser medo de não se ver espelhado como se imaginou, pode ser medo se sentir o próprio eco que o outro lhe devolve? Narciso não ouve a própria voz, Narciso despreza Eco que é ele mesmo. Narciso é só imagem, é preocupação com a gratificação e a validação externa, enquanto ele mesmo se esconde.

Para mim, a história de Eco se casa perfeitamente com a psicanálise, pois a psicanálise é de qualquer modo um eco na voz do analisante. O fim de quem não se ouve e só vê a própria imagem é trágico, e é isso o que mais se vê por aí…

E aí, de fato, tem um clichezão, pois a imagem que todos passam é igual, não tem eco, não tem subjetividade, não tem a própria voz. Assim, toda pessoa sarada, rica e egocêntrica é carimbada de narcisista.

Para finalizar, deixo um grito, esperando que ecoe: Volta Eco e salva Narciso desse espelho!

Autora do Texto: Daia Florios
Fonte da Publicação: Instituto Falasser

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